Último dia de aula. Férias finalmente! Comemorei.
Abílio, meu pai, encostou o carro e eu entrei.
― Passaremos no supermercado, sua mãe quer papel de presentes, fitilhos e enfeites para os presentes.
― Não pegaremos a Letícia?
― A Letícia não foi à escola, foi para o cabeleireiro com a sua mãe. O voo sai às 18:00h. Esteja pronto e com as malas na sala. Não atrase, João.
― Minhas malas já estão prontas, só a necessaire com a escova-de-dente, etc. é que ficará por último. Jorge, meu primo, disse que lá tem havido nevasca. É melhor reforçar os agasalhos.
― Detesto frio, eu iria para um país tropical e me bronzearia em uma praia olhando as meninas em seus biquínis. ― resmungou papai.
Achei a ideia de meu pai ótima, mas era a vez de mamãe escolher aonde passaríamos o Natal.
Compramos tudo que estava na lista de Dione, minha mãe.
De casa ao aeroporto eram 3:00 horas, tínhamos que estar lá às 16:00h.
Pegamos a estrada e começou a nevar. Achei que não chegaríamos nunca. Entramos no aeroporto 15:45h. Não deu tempo para nada, fomos direto fazer check-in.
Letícia, minha irmã, estava com fome, tomamos chocolate quente e comemos um sanduíche.
Meu pai estava estranho. Suas mãos tremiam e ele as colocou no bolso.
― Papai, esquenta suas mãos na caneca. ― sugeri.
― Elas já estão esquentando. É que fiquei muito tempo na direção. ― respondeu meu pai.
― Quer que eu faça massagem nelas, papai? Trouxe um creme para aquecer as mãos. Seja minha cobaia, veremos se funciona e se valeu o que paguei.
Meu pai tirou as luvas e Letícia fez a massagem. Ele colocou as luvas novamente e mamãe deu um xale para ele colocar sobre as mãos enquanto esperávamos a chamada para o embarque.
O voo saiu no horário. Dormi a viagem toda. A aeromoça passou acordando todos e mandou colocar o cinto de segurança.
Papai havia alugado um carro para chegarmos até a casa de tia Eliana.
Mamãe perguntou se não era melhor pegar um táxi, pois estava nevando e não conhecíamos o caminho, iríamos pelo mapa. Papai a tranquilizou.
― São onze quilômetros e estaremos em frente à casa de sua irmã. Não há como se perder.
Andamos quatro quilômetros e uma nevasca começou. Não dava para enxergar nada, papai parou no acostamento.
― Esperaremos amenizar um pouco, não enxergo a estrada. ― falou papai.
― Ficamos mais de duas horas e nem sinal da nevasca parar. Já era noite quando o tempo melhorou. O carro estava coberto de neve, eu e papai pegamos a pá que estava entre as ferramentas do carro e tentamos limpar um pouco a frente do carro para podermos voltar à pista principal.
Vi papai se apoiar no carro e senti que ele ia cair e o segurei.
― O que aconteceu?
― Dor. Não aguento de dor no peito. ― gemeu papai.
Ajudei meu pai a entrar no carro, no banco de trás. Minha mãe ficou histérica e começou num choro convulsivo.
― Mamãe, você tem que dirigir.
― Não posso! Odeio dirigir. Não sei dirigir em estradas. Devíamos ter pegado um táxi. ― chorava ela.
Fui para o banco do motorista. Letícia passou para o banco da frente, para dar mais espaço para papai. O carro demorou a pegar.
― Onde está o mapa do papai? Não sei o caminho. ― perguntei.
― Papai disse que eram onze quilômetros. ― falou Letícia.
Fui dirigindo devagar, pois a estrada era muito escura e não havia nenhuma placa.
Ouvi meu pai dizer claramente:
― Tudo bem, João. Estou melhor, olhe na quilometragem e ande quatro quilômetros, entre no primeiro desvio à direita e chegamos em três quilômetros.
Senti um alívio enorme com a tranquilidade que meu pai me orientou.
Chegamos e a casa da tia Eliana estava com todas as luzes acessas. Sabiam que chegaríamos e estavam preocupados devido ao temporal.
Tio Osvaldo me ajudou a carregar papai para dentro.
Uma ambulância foi chamada, papai estava inconsciente. Ele tivera um infarto e ficou internado.
Deixamos ele no hospital e voltamos já em casa e aquecidos, tia Eliana queria saber tudo que acontecera.
Contei como papai me orientara.
― Papai estava inconsciente desde que você o colocou no carro. Ele não falou com você. ― afirmou, surpresa, Letícia.
― Claro que falou, eu não sabia como chegar aqui. ― me irritei com Letícia.
― Ele não falou, João. Eu estava em pânico, pois achava que ele estava morrendo. ― confirmou mamãe.
― Mamãe, eu não tinha o mapa e não sabia o caminho, ele me disse como chegar.
Tia Eliana entrou na conversa: não importa em que hora você ouviu seu pai, essa orientação dele salvou vocês. A previsão do tempo informou que a temperatura chegou a -12ºC, o suficiente para congelar qualquer um que dormisse no carro sem aquecimento.
Quando meu pai saiu do hospital, ele não lembrava de nada, só que eu o impedira de cair.
Passamos o Natal com tia Eliana.
Entendi que algo sobrenatural aconteceu entre mim e meu pai. Estudei todos os efeitos sobrenaturais e não obtive nenhuma resposta que me convencesse, mas tive certeza de que meu pai se comunicou comigo enquanto estava inconsciente.
Este foi o meu despertar.
Fim
Obrigada Dion.