Fui uma pitonisa, mulher que tinha o dom da profecia.

Desde muito pequena, fui tirada da minha família e criada para ser uma das virgens do templo de Apolo.

Nunca pude sair do templo, havia uma ala só para as futuras pitonisas.

Tomávamos sol e descansávamos no jardim. Uma área enorme, de paredes altas e muito bem vigiada. Um jardim atravessado por uma nascente de rio que além de embelezar o jardim, enfeitava e tornava nossas tardes alegres, nos dias de calor.

As pitonisas eram ensinadas a desenvolverem seus dons mediúnicos, lerem os registros akáshicos e verem as possibilidades no futuro.

Os sacerdotes tinham profundos conhecimentos de como agia a mente humana e nos dominavam totalmente, além de nos drogar nas horas dos atendimentos. Era uma droga que provocava a expansão da consciência e facilitava as respostas que eles queriam, sem a interferência da consciência da pitonisa.

Eu tinha uma mediunidade espontânea, a clarividência e ouvia e via os seres. Um deles, um obsessor, se fez meu amigo e contou como os sacerdotes nos dominavam.

Senti uma revolta imensa. Éramos escravas deles. Até nossa consciência era dominada e nem percebíamos.

A droga era colocada na água, que era servida como sendo purificada por eles. Só as pitonisas podiam beber.

Parei de beber aquela água. Usava a água de outra fonte.

Em um atendimento, descobri a razão das drogas. Os sacerdotes manipulavam os dirigentes com suas premunições e com suas maldições.

As pitonisas, durante esse tempo, ficavam totalmente desconectadas, como se estivessem possuídas por uma divindade. Ninguém duvidava delas e de suas previsões. As pitonisas eram levadas em uma cadeira especial, carregadas pelos sacerdotes e colocadas no altar e ninguém podia se aproximar.

Os sacerdotes ordenavam as pitonisas o que elas deveriam dizer, antes de colocá-las em sua cadeira especial e entrar no salão do altar.

Um dia, eu esqueci o que era para dizer e falei o que me foi mostrado. O sacerdote me retirou do salão do altar e me batendo com uma vareta, mandou eu me concentrar. Fiquei com tanta raiva que o amaldiçoei, acusei-o de usar os deuses para trapacear e previ a morte dele, tendo o pescoço quebrado, muito em breve.

O sacerdote me olhou com muito medo e se retirou. Outro sacerdote ocupou o lugar dele e eu me comportei normalmente.

Alguns dias após, o sacerdote que eu amaldiçoara caiu de uma escada e quebrou o pescoço. Pura coincidência.

Desse dia em diante, eu fui afastada dos atendimentos e transferida para outro templo.

Durante essa transferência, enquanto os cavalos descansavam e os guardas também, eu fugi para o mato.

Meu amigo obsessor mandava eu fugir, alegando que eu ficaria presa e isolada até a morte. Nem sei por que fugi, eu não conhecia nada, não sabia onde estava e nem para onde ir.

Meu amigo invisível, o obsessor, levou-me para uma casa não distante dali.

― Eu morava aqui. É um lugar deserto, ninguém virá procurá-la aqui. ― disse ele.

Ele estava enganado. Fui achada pelos soldados que me levaram de volta. Os sacerdotes não me queriam por perto e aproveitaram para me declararem louca e me fecharam em uma masmorra. Morri lá, de fome, frio e sede.

Tive conhecimento da vida espiritual e de um obsessor. Essa vida não foi nada agradável. Conheci a espiritualidade, o ódio e o desejo de vingança. Precisei de várias experiências para conhecer a luz.

Esse foi o meu despertar.

FIM

― Obrigada, Bete. Tem razão, uma experiência de escravidão nada agradável.

Adorei a sua presença, volte sempre que puder. Eu não fico mais mal-humorada quando alguém do outro lado tenta falar comigo. Chamo minha egrégora e, se necessário, faço o recolhimento.

Feliz aniversário! Se isso ainda valer alguma coisa.

― Não fiquei mais velha, mas a lembrança, o carinho e amor de todos os amigos e parentes que lembraram, valeu muito. Nos vemos por aí.

Conheça mais sobre quem contou uma de suas vidas.

Bete

Palestrante na Colônia Nazaré

A convidada de hoje se chama Bete e desencarnou recentemente.

Boa noite, Bete. Como você veio parar aqui?

― Eu queria falar com você. É a única que ouve e sempre está em paz. Quando eu soube que precisava agendar para contar a vida do despertar, eu pedi para entrar na fila.

Como aqui todos são muito gentis e sabiam que ainda o aniversário é lembrado com carinho, eles me deram esse dia especial.

― Obrigada, Bete. Sua presença é uma alegria, uma honra e me trouxe um sentimento muito bom. É ótimo saber que está bem. Fale sobre você.

― Fui muito bem recebida pelos nossos amigos e familiares, quando aqui cheguei. Precisei de um repouso, um tempo para desapegar de tudo que eu considerava meu, mesmo sabendo que nada traria. Foi meio complicado. Continuo limpando esses apegos. Já participo de reuniões e visito os recém-chegados sempre que posso acrescentar algum bem-estar a eles.

― Como é o lugar que você está? Pode dizer o nome do hospital ou colônia?

― Fui para o hospital Santa Maria e lá foi feito a primeira triagem, isto é, deixei toda a carga energética mais pesada, como a dor física que ainda sentia, a dor de deixar meus filhos, meus netos, irmãos e o resto da família.

Agora estou em uma colônia de nome Nazaré. Um lugar lindo, jardins com fontes deslumbrantes, impossível descrevê-las. O perfume das flores é um espetáculo à parte.

A maior parte do tempo é usada para recebermos emanações de paz, harmonia e alegria até que toda a energia pesada que ainda tenho comigo seja transmutada.

É um estágio no qual gradualmente vou me familiarizando comigo mesma, descobrindo que sou imortal, um anjo. Assim que recuperar a memória e sentir a minha essência divina comandando a minha vida novamente, conhecerei a liberdade e só aí, poderei entrar em grupos de trabalhos. Isso significa que não terei mais energias egoicas que me impedem de me libertar de todos os apegos materiais.

― Sente muito a falta da vida terrena?

― Sim. É por isso que continuo nessa colônia. Se não amasse tanto a minha família, não teria essa quantidade de apegos. Isso não me impede de ser feliz e confraternizar com todos aqui e os que chegam.

― Quer nos contar algo especial?

― Tudo está se desenvolvendo conforme as leis do Universo e todos passarão por esses estágios. Até fiquei menos rebelde. Tive algumas surpresas boas e algumas decepções, pois fantasiava a vida espiritual. Inclusive, esquecia a hierarquia.

Sabe que para poder falar com alguém encarnado é preciso a permissão do mentor da pessoa e do meu? Hoje não foi uma exceção.

Eu pensava que poderia me comunicar com você quando eu quisesse.

Tenho que, tenho não, sou obrigada a seguir um regime da lei do respeito ao encarnado e aos seus protetores. Não me comunicar sem autorização prévia, mesmo eles sendo meus amigos.

Quem desrespeita essa lei é um obsessor. Interfere no dia a dia e na frequência do encarnado. Teoricamente, até eu sabia, mas senti isso com força total.

Avisaram que você poderia me mandar presa, de volta ao hospital, caso estivesse mal-humorada e não quisesse ouvir ninguém do outro lado. Eu não teria tempo de me identificar.

Lá, eles teriam que retirar a grade eletromagnética que me prendia. Eu teria que ficar e assistir muitas aulas sobre a não intervenção sobre o encarnado.

Esse ensinamento é para uma plateia que está esperando pelo relato da minha vida do despertar.

― Como vou representá-la?

― Um anjo, com asas. Bonita, no meio de um jardim lindo, cheios de fontes mais lindas ainda. Com roupas de anjo, uma túnica comprida, azul-claro. Ainda não decide minha aparência, talvez eu fique com essa mesma.

― Obrigada pelos esclarecimentos, Bete.

― Minha experiência: “A Pitonisa”.