Nasci em uma cidadezinha longe de tudo. Não tinha médico, farmácia, lojas de roupas ou sapatos. Meu nome era Gervásio, nome herdado de meu avô.
Tudo lá era artesanal.
Meu pai confeccionava botas de couro, bolsas, cintos, malas e uma vez a cada três meses, levava para uma feira e lá vendia. O couro era de cabra, chamado de camurça.
Minha mãe comprava na feira tecidos, panelas e objetos para casa.
Nós, as crianças, ficávamos em casa, pois a viagem era a cavalo, longa e cansativa.
A primeira vez que fui à feira, eu tinha 12 anos e quis conhecer todas as barracas. Uma cheia de vidrinhos, maços de folhas amarradas e penduradas me fascinou. Fiquei horas conversando com o casal que fazia os remédios.
Ganhei amostras e mudas de quase todas as ervas para plantá-las. Algumas como temperos, outras para chás, outras para remédios.
Meu pai teve que comprar um caderno e um lápis, para eu anotar tudo sobre cada erva que ganhei.
Plantei minha horta. O primeiro pé de hortelã cresceu e ficou lindo. Fiz meu primeiro chá e dei para minha avó, que vivia com dor de estômago e passava a noite virando de um lado para outro.
Minha avó adorou o chá. Sentiu que a acidez do estômago diminuíra e dormiu, acordando com o próprio ronco.
Sem eu perceber, comecei a ser procurado por quem tinha dor de cabeça, insônia, enjoo, etc. Continuei a frequentar a feira e aprender mais com o casal José e Maria.
Nessa vida, eu me tornei o curador da cidadezinha. Qualquer mal-estar e iam me procurar.
Um dia, enquanto eu plantava, eu percebi uma luz em minha mão. Fiquei olhando encantado para ela.
Minha irmã me chamou e quando fui mostrar a luz, ela desaparecera. Atendi minha irmã e continuei a plantar, mas a luz não voltou.
Eu havia aprendido com José e Maria a agradecer a erva quando fazia chás, e principalmente os remédios, para pedir e agradecer para a planta fornecer suas propriedades curativas.
Minha avó tinha dor de estômago após as refeições e assim que tomava o chá sentia alívio. Ela disse:
― Você tem as mãos abençoadas, seus remédios curam.
Fiquei pensando no que ela dissera.
No dia seguinte, quando estava plantando, eu disse em voz alta: semente de camomila, germine e cresça como uma touceira enorme, bela e cheia de flores.
Minha horta ficou parecendo um jardim de tantas flores.
Pensei: a semente me ouviu ou foi uma coincidência? Plantarei um pé de lavanda. Repeti as mesmas palavras. Plantei um canteiro só de lavandas.
Elas ficaram tão lindas que pessoas vinham só para admirar minha horta que agora parecia um jardim.
Nunca mais vi a luz em minhas mãos.
Ganhei a vida, vendendo flores, remédios de ervas e chás, todos plantados por mim.
Essa vida foi a preparação para a minha ascensão. Um lugar onde tive contato direto com a natureza.
Quando eu tinha 25 anos, meu cavalo foi picado por uma cobra, disparou e me jogou para fora da cela. Morri na queda. Ascensionei e não precisei mais voltar.
Fim
― Obrigada, pai Chiquinho. Foi um enorme prazer recebê-lo.