Nasci em uma família de classe média, na antiga Itália. Éramos 11 irmãos. O meu nome era Giuseppe.
Meu pai era um marceneiro, não bem-sucedido. Trabalhava como marceneiro durante o dia e o encerrava sempre alcoolizado.
Minha mãe lavava, cozinhava, passava roupa, bordava e reclamava da vida e do marido.
A comida nem sempre dava para todos. Minha mãe repartia igualmente entre os treze. Ou todos matavam a fome, ou todos passavam fome. Esse era o regime da casa.
Aos 10 anos aprendi a profissão com meu pai, só que eu era um artista nato. Esculpi a madeira e fiz móveis lindos.
Meu irmão, Paolo, gostava de pintar e aprendeu técnicas diferentes e as usou nos móveis. Nossas cadeiras passaram a ser vendidas nos palácios e casas ricas. Em um ano, estávamos conhecidos na cidade como a Casa dos móveis ricos. Nossa vida mudou.
Não queríamos mais a presença do pai, ele nos envergonhava. Começava bebendo um copo de vinho no almoço e não parava mais.
Minha mãe também não queria o marido em casa, geralmente ele acabava vomitando a comida e o excesso de vinho.
Construímos um quarto no fundo da marcenaria e o mandávamos para lá, descansar após o almoço. Ele fez isso até morrer de tanto beber. Ele era um homem feliz a seu jeito.
Quando meu pai morreu, os outros nove irmãos resolveram que tinham direito ao dinheiro sobre as vendas dos móveis. A briga começou.
Eu e Paolo trabalhávamos o dia inteiro e ainda saíamos para vender e eles, que nunca entraram na marcenaria, achavam ter direito a quê?
Minha mãe encerrou o assunto da seguinte maneira:
Giuseppe e Paulo fazem os móveis e vocês vendem e dividem por três o valor, após tirar as despesas da madeira, da tinta e da condução de quem está vendendo. Cada um receberá conforme o que vender. Quem não trabalhar, não receberá nenhum centavo e será expulso de minha casa.
Desse dia em diante, começou uma guerra entre os irmãos. Eu e Paolo não dávamos conta da quantidade de móveis necessários para todos venderem.
Eles ficavam sentados, esperando por um móvel para saírem e havia a discussão de quem era a vez de ganhar a venda.
Um dia, após o almoço, fui para o antigo quarto do meu pai e me deitei um pouco. Pensei e falei alto:
― Papai, você faz falta. No seu tempo, mesmo quando não havia comida para todos, ninguém discutia ou se esmurravam rolando pelo chão. Trabalho muito mais e não consigo reunir a família. Será que existe alguma solução?
― Claro que existe. É só eles procurarem o que sabem fazer. Eles sabem vender? Existem marcenarias que não conseguem vender por falta de bons vendedores.
Escutei meu pai. Meu coração quase parou. Tive medo de olhar para o lado e ver meu pai. Não sei quanto tempo levei para ter coragem de me mexer. Olhei para todos os lados e estava só. Sentei na cama, coloquei os sapatos e sai. Aleguei não estar me sentindo bem e fui para casa, ou melhor, para a igreja.
Sentei no banco da igreja e rezei pela primeira vez por meu pai. Pedi perdão por haver sido um filho indiferente, insensível.
Ouvi uma risada baixinha, como meu pai costumava rir, para não acordar as crianças.
― Você foi meu orgulho. Não tive o seu abraço, mas todo vinho que sempre sonhei e nunca pude comprar. Toda comida que deixei de comer para sobrar um pouco mais para vocês. Não me peça perdão, apenas seja feliz, isso é suficiente para mim. Estou indo embora, uma nova vida me espera.
― Pai! Espere.
― Precisa de ajuda, meu filho? ― falou o velho padre.
― Comecei a rezar e acho que adormeci e sonhei. Desculpe se o atrapalhei padre.
― Não me atrapalhou, Giuseppe. O que o seu pai lhe aconselhou?
― Ele me disse para ser feliz, que isso é suficiente.
― Então faça o que ele disse.
Fui para casa e desse dia em diante comecei a me questionar: como pude ouvir uma pessoa morta? Uma nova vida o esperava? Tenho de descobrir isso. Comecei a ler tudo sobre o assunto após a morte. Não tive nenhuma resposta nessa vida, mas foi o meu despertar.
Fim
― Obrigada, Chamberlen.